sábado, 6 de outubro de 2012
Sobre a polícia
O CÃO DE GUARDA DA BURGUESIA - (Canis lupus centurio legionarius) - ERNESTO DEGREDO
O cão policial é uma espécie que pertence ao reino canalha, ao filo dos depravados, à classe mediária, à ordem vigentívora, à família dos Ubiratan Guimarães e dos Conte Lopes. O mais antigo animal a ser domesticado na sociedade. Seu habitat natural é a selva, todavia seu adestramento é feito em um cativeiro, conhecido como quartel. É no quartel que o simples cãozinho se transforma no defensor da ordem; no mais agressivo defensor da tradição, da família e da propriedade. Aquele que impede que os de baixo pulem as muralhas do de cima, explica o alto cão policial, o coronel Plínio Correia de Oliveira.
Ao nascer, o cão policial – ou, como alguns preferem chamar, o cão de guarda da burguesia – é apenas um cãozinho normal, como qualquer outro. Para ser um policial ele deve passar por uma metamorfose artificial, por meio do treinamento que visa atrofiar seu cérebro. Isto porque a grande maioria dos cães policiais são, a princípio, vira-latas. Ora, se a função dos cães policiais é proteger os “de raça” de outros vira-latas, seria um contra-senso mantê-los como vira-latas. Neste sentido, é necessário que o cão policial esqueça sua real condição e passe a acreditar que é um cão de raça.
O treinamento desses cachorros baseia-se no desenvolvimento do reflexo corporal em detrimento do reflexo intelectual. Para os meus meninos combaterem os meliantes, eles têm que pensar com os dentes e não com a cabeça. Têm que confiar nos extintos que ensinamos a eles. Têm que ver bandido na rua ou na favela e saber que é bandido. e tratar bandido feito bandido, sem pensar, afirma o mesmo coronel. Decerto, seu treinamento visa não só a total obediência aos donos, mas também a total agressividade para com outros seres. Se por um lado, os cães de guarda da burguesia são condicionados a sentarem-se, deitarem-se, fingirem-se de mortos e darem a patinha ao sinal de uma simples ordem do dono, por outro, aprendem a morder ferozmente pobres, negros e manifestantes. Mesmo os cãezinhos mais inocentes e bondosos que chegam à corporação, transformam-se em obedientes feras perigosas.
Aqui a raça é uma só. Você pode ser Pitt-Bull ou Labrador, num interessa, nóis faz você virá policial, afirma cabo B., que não quis identificar-se. Sem dúvida, o treinamento desses cães não deixa brecha a individualidades. Se há algum vira-lata que não se enquadra, ele logo recebe a vacina, completa o cabo. Ele não se refere à vacina anti-rábica, mas à dose de três miligramas de poder que alguns cães da corporação recebem na veia, para ficarem imunes a certos sentimentos como a piedade. Tal vacina, a fascistolida, que tem como base o vírus da raiva, é um avanço na tecnologia de poder e vem sendo aperfeiçoada em todo o mundo, desde a fundação do governo Mussolini, na Itália.
Por serem predadores de pobres, negros e comunistas, os cães policiais foram trazidos ao Brasil com a finalidade de conter essas pragas, que se disseminam e ameaçam plantações de desigualdade em latifúndios de coronéis. Com o tempo o cão policial tornou-se prolífero e é hoje um dos animais de maior população no país.
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